Antônio de Souza Filho
Meus Escritos
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O Sorriso da Cobra
 
Nem todos os dias temos motivos para estar em largas gargalhadas, isso é óbvio. A vida é assim, formada por momentos, às vezes bons, outras vezes nem tanto e também aqueles momentos que não gostaríamos mesmo de passar por eles, não é verdade?! O que a maioria das pessoas não conseguem atinar é para a beleza que há em tudo isso, até mesmo nas coisas desagradáveis. Pode parecer um paradoxo, beleza na desgraça, alegria na tristeza..., como isso é possível? Mas é possível sim, basta que compreendamos algumas coisinhas que se escondem, somente para nos destruir, ou seja, levar-nos a um momento de desespero e desânimo. O quase impossível é manter o bom humor, ante todas as dificuldades; o mais comum é que as pessoas fecham a cara com clara manifestação de contrariado, aborrecido o que só prejudica cada vez mais aquele momento indesejável.  Mas vamos aos fatos.
 
Neste último sábado eu tive uma forte noção do que estou dizendo e quero compartilhar com você. Pra isso vou contar uma historinha acontecida com meu amigo Messias, vizinho nosso de ramal no sítio que temos fora da cidade. É um local muito bonito, com igarapés de águas cristalinas e soberba vegetação. Ali, mora e vive praticamente sozinho, esse gente boa, que adoro visitar e sempre trocamos largas gargalhadas pelo fato dele ser muito engraçado e gostar de coisas parecidas com as minhas, - citar cordéis é uma delas e isso ele faz com maestria; chega a contar um livrinho inteiro com muita graça, e eu adoro. Seus filhos o visitam apenas uma vez ao mês, daí nossa amizade ser mais intensa.
 
Por três finais de semana eu não o visitava, e da última vez, ele não estava nada bem, por isso fui vê-lo, um tanto apreensivo com a sua saúde, desejando por dentro que ele estivesse bem. E assim aconteceu, logo que entrei pelo portão Ele saiu pra me receber, e foi logo dizendo: - Aí meu amigo doutor, como você está, já pode sentar?... -  rsrsr – eu ri e respondi: - Velhim safado meu amigo companheiro, quem andava lascado se eu não me engano era você, me conte desde logo como isso foi acontecer. – Ele riu novamente já pensando nas histórias de Cordel.
 
Entramos e ele começou a preparar um café, que eu, como sempre, nunca tomo por medo da água que ele puxa direto do igarapé, ele me oferece e eu digo: - não obrigado e falo baixinho, não quero morrer agora não... ele é meio surdo e eu também e a gente fica assim... termino dizendo: - tomei uma pinga agorinha... rsrsr..
 
Sentamos e Ele começou a falar com riso no rosto: - Mas doutor, quase eu embarco pro além, se eu ia pro céu ou pro inferno eu não sei, só sei que quem tava me querendo vai esperar mais um pouco, agradeço a cobra. Aí eu falei: - que cobra, do que você tá falando? Ele respondeu: - Lembra que eu tava baqueado? Eu disse: - Sim, lembro, Ele continuou: - pois é, eu tava com um monte de merda espalhada pelo corpo, uma pneumonia que não curava, uma inflamação na próstata, uma hemorroida que doía mais que o diacho que eu não podia nem sentar direito só ficava de lado, além duma coceira miserável no brioco que me deixava louco. Senti vontade de ri, mas me controlei. Aí eu falei: - Mas, e aí, onde é que a cobra entra nessa história? Ele riu e disse: - Quer mesmo que eu diga e riu outra vez... falando sério meu amigo, eu tava pra pedir pinico e uma noite eu aqui sozinho, pensei vou morrer e ninguém vai saber... aí me ajoelhei cheio de dor e coceira e falei com Deus: - O Senhor tome uma decisão ou me cure ou me leve logo de uma vez, de amanhã não passa... - Eu me lembrei de Moisés quando bateu na Pedra pra jorrar água -.
 
Ele continuou: - Quando amanheceu, só ouvi os gritos das galinhas, eu corri pra ver: era uma Sucuriju dando uma laço numa galinha, ela deu-lhe um aperto tão grande que os intestinos da Anita saíram todos pela válvula de escape, tudo espalhado no terreiro e eu me assustei, por que a cobra era muito grande. Então peguei um cacete e larguei-lhe na cabeça dela, não sei donde me veio coragem e força, ela apagou, então peguei o terçado e decepei a cabeça dela; deixei-a esticada no Sol; lá pelas três da tarde fui medir e abrir a bicha, dava quatro metros e meio, retirei mais de quatro quilos de banha, então eu pensei: - a minha cura chegou. Comecei a tomar uma colherzinha da banha todo dia de manhã em jejum, nossa mãe de Deus dava vontade de vomitar o que eu não tinha na barriga, mas tomava. No terceiro dia eu comecei a ver a melhora – a hemorroida sumiu, a próstata secou, e o patrício acordou.... rsrsr – e eu falei: - ah, mentiroso esse patrício já tá sepultado...rsrsr, e a coceira ? Ele riu e disse: - Também sumiu. - Ele de fato estava com novo vigor - pero que si pero que no – não lhe virei as costas. rsrs...
 
Na volta pra casa vim meditando: - o Messias poderia estar morto e seria um fato simples, pois todos morrem. Entretanto mesmo numa vida atípica e isolada encontra motivos para ser alegre e sorrir constantemente, enquanto milhões de pessoas vivendo bem não veem beleza na vida e só andam de cara emburrada. - Lembro que aprendi com as escrituras que não devemos nos inquietar com o dia de amanhã, pois o amanhã trará os seus cuidados, basta ao dia o seu próprio mal, também aprendi que o que é já foi, e o que há de ser também já foi. Deus fará renovar-se o que se passou e tudo tem o seu tempo determinado, e há tempo para todo propósito debaixo do céu.
 
Quanto a cobra e sua banha realmente procede, ela tem um elevado poder de cicatrização.
 
Vamos sorrir sem precisar da cobra?
 
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Antônio Souza
(Crônicas)
 

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Antônio Souza
Enviado por Antônio Souza em 26/07/2019
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